Dois empresários investigados por participação num esquema de lavagem de dinheiro ligado ao Primeiro Comando da Capital (PCC) apresentaram-se à Polícia Civil na última sexta-feira (5), em São Paulo. Alessandro Rogério Momi Braga, conhecido como “Morango” ou “Alemão”, e Manoel Sérgio Sanches, chamado de “Mané”, estavam entre os alvos da Operação Falso Mercúrio, deflagrada pelo Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic) na semana anterior.
Rede empresarial é apontada como centro da lavagem
Braga figura na investigação como proprietário do Grupo Key Car, conjunto de empresas considerado peça central no esquema. Segundo relatórios do Deic, as companhias receberam valores provenientes de crimes como tráfico de drogas, jogos de azar, estelionato e extorsão. O dinheiro em espécie era recolhido por “coletores” e entregue ao núcleo coordenado por Braga, que então realizava pagamentos ou transferências bancárias para contas de empresas de fachada ou dos próprios coletores, devolvendo os valores já “limpos”.
Em troca, o grupo cobrava comissão paga por boletos ou depósitos em contas de terceiros. O documento da polícia descreve ainda situações em que intermediários recebiam montantes em espécie e faziam depósitos diretos nas contas dos coletores, simulando transações comerciais. Mensagens extraídas de telemóveis apreendidos mostram Braga orientando o fracionamento dos pagamentos, técnica utilizada para evitar a identificação pelas autoridades de fiscalização financeira.
Os investigadores afirmam que o empresário colocou o CNPJ de uma de suas firmas à disposição para registrar um veículo de uma pessoa ligada aos coletores, sinalizando oferta de serviços de ocultação patrimonial. Em outra frente, carros de luxo registrados em nome das empresas de Braga e Sanches eram disponibilizados a criminosos interessados em evitar o rastreamento de bens. Durante a fase ostensiva da operação, realizada na quinta-feira (4), foram apreendidos 257 automóveis avaliados em R$ 42 milhões, conforme a Secretaria de Segurança Pública.
Movimentação milionária e participação de sócio oculto
Documentos reunidos pelo Deic indicam que Braga movimentou ao menos R$ 17 milhões em pouco mais de dois anos. Os investigadores consideram, contudo, que o valor representa apenas parte do montante total derivado da rede de empresas laranja. Todos os gerentes e sócios identificados no esquema se reportavam diretamente a ele, caracterizando-o como liderança operacional.
Manoel Sérgio Sanches, apontado como sócio oculto do Grupo Key Car, aparece em diversas conversas com Braga e com suspeitos classificados como coletores ou beneficiários finais. Numa delas, Sanches tenta intermediar um pagamento de R$ 400 mil. A conta indicada pertence a uma casa de pôquer cujo endereço coincide com o de um bar karaokê no bairro da Liberdade, região central de São Paulo. O beneficiário demonstrou receio, mas acabou convencido após ouvir um áudio de Braga defendendo o uso de contas ligadas a apostas para justificar eventuais questionamentos, alegando vício em jogos.
Sanches estava na sede da empresa durante o cumprimento de mandados de busca e apreensão na primeira fase da Falso Mercúrio. As autoridades afirmam que a presença reforça o elo entre ele e a gestão do grupo empresarial. Nas conversas interceptadas, os dois discutem valores recebidos pelos serviços de lavagem, o que, segundo a polícia, confirma a parceria.
Imagem: Internet
A explosão da movimentação financeira foi identificada por meio de relatórios de inteligência bancária. As transferências fracionadas, normalmente inferiores aos limites de comunicação obrigatória aos órgãos de controle, permitiram que milhões de reais circulassem diariamente sem chamar atenção imediata. O uso de boletos, depósitos em espécie e empresas registradas em nome de terceiros compôs a estratégia de diluição dos rastros.
Com o avanço da investigação, o Deic solicitou mandados de prisão e de busca. Vários endereços comerciais e residenciais ligados aos suspeitos foram vistoriados. Além dos veículos de alto valor, agentes apreenderam documentos, computadores, telemóveis e registros contábeis que, segundo eles, ajudam a mapear toda a estrutura financeira.
Próximos passos da investigação
Após a apresentação espontânea, Braga e Sanches foram submetidos a interrogatório e permanecem à disposição da Justiça. A polícia ainda analisa o material obtido para identificar possíveis novos envolvidos, estimando que a rede utilize “dezenas” de empresas para mascarar a origem dos recursos. A Operação Falso Mercúrio segue em curso, e outras fases não estão descartadas.
O Deic também prepara relatórios para encaminhar à esfera federal, responsável por eventuais acusações de lavagem de dinheiro transnacional, dado o potencial de remessa dos valores para fora do país. Até o momento, não há informação oficial sobre quantos investigados permanecem foragidos nem sobre bloqueio de bens adicionais.





