O Restaurante da Sociobio tornou-se ponto obrigatório para delegados, voluntários e trabalhadores durante a COP30, em Belém (PA). Instalado na Zona Azul da conferência, o espaço ofereceu 4 000 refeições por dia e somou aproximadamente 52 000 pratos completos ao longo dos 13 dias oficiais do encontro, todos preparados com ingredientes fornecidos pela agricultura familiar local.
Operação voltada a saúde, sustentabilidade e solidariedade
A cozinha foi organizada por um consórcio que reúne a cooperativa Central do Cerrado e a Rede Bragantina. Segundo o zootecnista Luis Carrazza, secretário-executivo da Central do Cerrado, o projeto baseou-se em três eixos: alimentação saudável, prática sustentável e incentivo solidário aos pequenos produtores.
Antes mesmo da abertura oficial da cúpula, a estrutura já funcionava para atender equipes envolvidas na montagem dos pavilhões. Contando esse período preparatório, o restaurante operou durante cinco semanas e ultrapassou 80 000 refeições servidas.
O serviço lembrava o de um restaurante universitário. Por R$ 40, o público recebia um prato feito, com direito a reposição livre — exceto proteínas —, além de suco e sobremesa. Entre os destaques do cardápio estavam pirarucu, cordeiro, búfalo da ilha do Marajó, suco de cupuaçu e doce de umbu, itens que reforçaram a diversidade alimentar da região amazônica.
Para dar conta da demanda diária, 85 profissionais foram contratados diretamente, enquanto mais de 50 organizações de agroecologia garantiram o fornecimento dos insumos. No total, cerca de 100 toneladas de alimentos foram adquiridas de produtores familiares.
Benefícios para produtores e para o clima
O nome Sociobio faz referência à sociobioeconomia, conceito que valoriza cadeias produtivas capazes de manter a floresta em pé. De acordo com Kamyla Borges, coordenadora de projetos do Instituto Clima e Sociedade, apoiar agricultores que adotam práticas sustentáveis reforça a ideia de que escolhas diárias, como a alimentação, impactam diretamente o planeta.
A iniciativa dialoga com o movimento Na Mesa da COP30, coordenado pelo antropólogo Maurício Alcântara. O grupo articulou junto à presidência brasileira da conferência o compromisso de reservar pelo menos 30 % dos alimentos de todos os espaços oficiais — Zonas Azul e Verde — para a agricultura familiar, adquirindo parte deles via Programa de Aquisição de Alimentos (PAA).
Alcântara destaca que pequenos produtores respondem por cerca de 70 % da variedade de alimentos que chegam às mesas brasileiras. Sistemas como agroflorestas, comuns na Amazónia, permitem produzir diferentes culturas lado a lado, preservar o solo e recuperar áreas degradadas.
Imagem: Internet
Números das emissões reforçam relevância da iniciativa
Os sistemas alimentares são responsáveis por aproximadamente 30 % das emissões globais de gases de efeito estufa. No Brasil, a participação chegou a 74 % em 2024, segundo o Sistema de Estimativas de Emissões e Remoções de Gases de Efeito Estufa (Seeg). O índice inclui emissões diretas da agropecuária e indiretas ligadas ao desmatamento.
Para Alcântara, o modelo de produção focado em grandes volumes de commodities contribui para que o país figure entre os cinco maiores emissores do mundo. A aposta em cadeias curtas, agroecologia e diversidade de cultivos pode reduzir impactos ambientais, ao mesmo tempo que fortalece economias locais.
Expectativa de legado em Belém
A produtora rural Maria Jeanira Pereira, presidente da associação Pará Orgânico e uma das fornecedoras do restaurante, espera que o exemplo da Sociobio permaneça após o encerramento da COP30. O objetivo é que restaurantes e demais estabelecimentos de Belém continuem adquirindo pelo menos 30 % de seus ingredientes da agricultura familiar, garantindo mercado estável para pequenos agricultores.
Pereira ressaltou que participar da conferência abriu espaço para dialogar sobre soluções climáticas diretamente com decisores. Na avaliação da agricultora, reforçar mercados locais é passo essencial para a transição rumo a sistemas alimentares mais justos e resilientes.
Com filas diárias de visitantes brasileiros e estrangeiros, o Restaurante da Sociobio demonstrou que é possível atender grandes eventos internacionais com refeições de baixo impacto ambiental, gerando emprego, renda e visibilidade para quem produz alimentos de forma sustentável na Amazónia.





