Cármen Lúcia critica machismo no Judiciário e cobra reação urgente contra feminicídios

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A ministra do Supremo Tribunal Federal (STF) Cármen Lúcia afirmou que o sistema de Justiça brasileiro continua “conservador, machista e sexista” e defendeu medidas imediatas para conter a escalada de assassinatos de mulheres no país. A declaração foi feita nesta segunda-feira (8) durante cerimónia em que recebeu o Prêmio Todas 2, parceria entre a Folha de S.Paulo e a consultoria Alandar, em São Paulo.

Representação feminina ainda limitada no STF e no Congresso

Atualmente, Cármen Lúcia é a única mulher entre os onze integrantes do STF. Ao longo de toda a história republicana, apenas três magistradas ocuparam assento na Corte: Ellen Gracie, Rosa Weber e a própria Cármen Lúcia. Para a ministra, a sub-representação dificulta a construção de uma perspectiva “verdadeiramente democrática e igualitária” dentro do Poder Judiciário.

No discurso, ela destacou que as mulheres correspondem a 52% do eleitorado brasileiro, mas seguem com participação minoritária no Congresso Nacional. Segundo a magistrada, o país exibe uma das piores proporções de deputadas e senadoras nas Américas, apesar de as cotas para minorias existirem desde a década de 1960. A ministra considerou a baixa presença feminina inaceitável num cenário em que existem, nas suas palavras, “mulheres de notável saber jurídico e reputação ilibada, prontas para colaborar com o Judiciário e com o próprio STF”.

Escalada de feminicídios preocupa a Corte

Cármen Lúcia usou o Dia da Justiça para sublinhar o aumento dos feminicídios. Ela classificou os crimes como “negação da civilização” e “ato de barbárie” e pediu uma reação coletiva para interromper o que chamou de “matança de mulheres”. De acordo com dados citados pela ministra, quase 700 crianças tornaram-se órfãs em 2023 em consequência de assassinatos cometidos contra suas mães, muitas vezes presenciados pelos próprios filhos.

“Não é mais possível continuar assistindo a mulheres sendo violentadas e assassinadas”, declarou. A ministra defendeu políticas públicas, integração entre instituições e engajamento social para estancar a violência de género. Para ilustrar a persistência do problema, ela parafraseou o poeta Carlos Drummond de Andrade ao lembrar o caso de Ângela Diniz, vítima de feminicídio em 1976: “Aquela moça continua a ser assassinada todos os dias e de diferentes maneiras”.

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Imagem: Internet

Desigualdade também se reflete na tecnologia

O Prêmio Todas 2 deste ano abordou a presença feminina na tecnologia, tema que, segundo Cármen Lúcia, igualmente revela disparidades. Ao comentar a recente auditoria das urnas eletrônicas, a magistrada informou que apenas 13 das quase 140 propostas de aperfeiçoamento submetidas ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) vieram de mulheres. Para ela, o dado demonstra que a exclusão de género se estende a áreas estratégicas para o desenvolvimento nacional.

Presidente do TSE no biénio 2024-2026, a ministra enfatizou a necessidade de imprensa livre e transparência durante as eleições municipais do próximo ano. Ela lamentou fraudes em cotas de género registradas em pleitos anteriores e reiterou que o Judiciário terá de agir para assegurar a participação feminina nos espaços de poder.

Chamado à ação e união feminina

Ao encerrar a intervenção, Cármen Lúcia afirmou que, embora reconheça avanços, o país ainda convive com “inúmeras lágrimas e feridas” que precisam ser tratadas coletivamente. Ela conclamou as mulheres a permanecerem unidas na defesa da democracia, da igualdade e da cidadania, valores que marcaram a sua trajetória no serviço público. A ministra recebeu a distinção por seu histórico de atuação em prol dos direitos humanos e da pluralidade institucional.

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