Um grupo internacional liderado pelo professor Luciano Rezzolla, da Universidade Goethe de Frankfurt, desenvolveu um método que utiliza as imagens do Telescópio Horizonte de Eventos (EHT) para comparar previsões de diferentes teorias sobre buracos negros. A abordagem recorre a simulações tridimensionais de alta precisão para verificar se as sombras observadas pelos radiotelescópios coincidem com a relatividade geral ou se favorecem modelos alternativos.
Imagens pioneiras levantam novas questões
Desde 2019, o EHT divulgou as primeiras imagens da sombra do buraco negro na galáxia M87 e, em seguida, de Sagitário A*, no centro da Via Láctea. Cada fotografia mostra um anel luminoso formado por matéria aquecida que gira nas imediações do horizonte de eventos. Embora esses registos confirmem aspetos-chave da teoria de Albert Einstein, eles também abriram espaço para avaliar explicações concorrentes.
A relatividade geral prevê a existência de um horizonte de eventos — limite além do qual nem a luz escapa — e descreve o espaço-tempo curvo que envolve esses objetos. No entanto, outras propostas teóricas sugerem configurações exóticas, como singularidades nuas (sem horizonte) ou buracos de minhoca. Parte dessas hipóteses exige propriedades de matéria ainda não observadas ou até viola leis físicas conhecidas, mas nenhuma havia sido testada de forma sistemática com dados de imagem.
Simulações detalhadas quantificam discrepâncias
Para transformar as fotografias do EHT em ferramentas de verificação, a equipa de Rezzolla realizou simulações numéricas que reproduzem o comportamento do plasma e dos campos magnéticos no entorno de vários tipos de buracos negros. Cada cenário teórico produziu uma assinatura visual específica, permitindo medir o diâmetro, a luminosidade e a espessura do anel de emissão.
O processo envolveu a técnica de interferometria de linha de base muito longa (VLBI), a mesma empregada pelo EHT, mas aplicada virtualmente dentro dos modelos computacionais. A partir dessa base, os investigadores criaram um sistema de caracterização universal que compara os parâmetros geométricos e fotométricos obtidos nas imagens observadas com os valores simulados.
Segundo Akhil Uniyal, do Instituto Tsung-Dao Lee, na China, o objetivo foi responder à pergunta: “Até que ponto as imagens de buracos negros divergem entre as várias teorias?” A resposta preliminar indica que a relatividade geral continua compatível com as observações, mas algumas alternativas extremas já foram descartadas devido às diferenças significativas previstas em relação ao formato e à intensidade do anel luminoso.
Imagem: Tecnologia & Inovação
Limitações atuais e próximos passos
A resolução alcançada pelo EHT ainda impõe incertezas que impedem conclusões definitivas. As imagens registadas em M87 e em Sagitário A* são consistentes com Einstein, porém a margem de erro permite que diversos modelos alternativos permaneçam viáveis. Por enquanto, apenas teorias que preveem ausência completa de horizonte de eventos ou túneles espaciais foram praticamente excluídas.
Rezzolla sublinha que testar continuamente a relatividade geral é crucial, sobretudo em ambientes extremos. Qualquer desvio observado num futuro próximo teria impacto profundo na física fundamental. A coligação internacional responsável pelo EHT trabalha para ampliar a rede de antenas e melhorar o processamento de dados, medidas que devem elevar a resolução e reduzir a incerteza nas próximas campanhas de observação.
Com uma imagem mais nítida, as diferenças entre as previsões das teorias concorrentes deverão tornar-se mais evidentes. O novo método de comparação, agora publicado pela equipa, ficará preparado para receber esses dados refinados e avaliar, com maior rigor, se os buracos negros se comportam exatamente como descreve Einstein ou se escondem propriedades ainda desconhecidas.





