Uma equipa da Universidade de Ciência e Tecnologia da China realizou, pela primeira vez, o experimento modificado da dupla fenda concebido por Albert Einstein há quase um século. O resultado suporta o princípio de complementaridade, defendido por Niels Bohr, e mostra que a tentativa de Einstein de conciliar comportamento ondulatório e corpuscular num único teste não se verifica na prática.
Como surgiu o desafio de Einstein
O experimento da dupla fenda, proposto em 1801 por Thomas Young, demonstra que partículas elementares podem formar padrões de interferência típicos de ondas quando atravessam duas aberturas paralelas. Nos anos 1920, Einstein discordou da interpretação quântica desse fenómeno e sugeriu uma variação: colocar uma fenda adicional, suspensa por molas ultrassensíveis, antes das duas fendas principais. Medindo o recuo dessa fenda, seria possível identificar por qual abertura o fotão passaria (carácter de partícula) e, simultaneamente, observar o padrão de interferência (carácter de onda). Se funcionasse, o dispositivo invalidaria a complementaridade de Bohr, segundo a qual não se podem medir essas duas propriedades em simultâneo.
Implementação com um átomo de rubídio
Transformar o conceito teórico de Einstein em prática experimental exigiu ultrapassar limitações técnicas. Molas capazes de detetar o impacto de um único fotão são inviáveis, por isso o físico Yu-Chen Zhang e colegas recorreram a um átomo único de rubídio mantido em pinças ópticas próximas do zero absoluto. Nessa temperatura, o átomo fica quase imóvel, funcionando como “alvo” sensível à passagem de cada fotão.
A rigidez da pinça pode ser ajustada: quando está mais solta, o átomo recua ligeiramente ao ser atingido e essa oscilação revela o caminho percorrido pela partícula. Quando a pinça está apertada, o átomo praticamente não se move, impedindo a determinação da rota do fotão. Este controlo torna possível alternar, em tempo real, entre condições que permitem ou impedem a obtenção da informação “qual-fenda”.
Resultados validam a complementaridade
Nos testes, sempre que o átomo se deslocou o suficiente para fornecer dados sobre a trajetória, o padrão de interferência deixou de surgir no detetor, evidenciando apenas o comportamento corpuscular. Por outro lado, quando o movimento do átomo foi suprimido, o padrão voltou a aparecer, confirmando o caráter ondulatório e ocultando a informação de percurso. Essas observações repetidas mostram que não é possível obter as duas informações simultaneamente, exatamente como previu Bohr.
Imagem: Tecnologia & Inovação
Segundo os investigadores, o aparato alcança o “limite quântico definitivo” para medições deste tipo, porque utiliza o menor sistema mecânico possível — um único átomo — e oferece controlo contínuo sobre a transição entre os regimes partícula/onda.
Próximos passos da pesquisa
A mesma configuração deverá ser usada para investigar outras questões fundamentais, como superposição e entrelaçamento, e verificar se essas propriedades se influenciam mutuamente. O grupo planeia ainda aprimorar a sensibilidade do sistema para estudar interações quânticas mais complexas e testar previsões de diferentes interpretações da mecânica quântica.
Com a realização deste experimento — longamente considerado apenas um exercício mental — a equipa chinesa confirma experimentalmente que a complementaridade mantém-se mesmo nas condições idealizadas por Einstein. O trabalho reforça a robustez da mecânica quântica contemporânea e abre caminho a novos ensaios de precisão envolvendo partículas únicas e sistemas mecânicos em escala atómica.





