Pesquisadores coreanos criam folha artificial que resfria e aquece sem eletricidade

Uma equipa de engenheiros do Instituto Avançado de Ciência e Tecnologia da Coreia (KAIST) apresentou um material flexível inspirado nas folhas do álamo capaz de manter ambientes mais frescos durante o verão e mais quentes no inverno, dispensando qualquer consumo de energia elétrica. O dispositivo, batizado de “Termostato Radiativo Latente”, alia evaporação, condensação e gestão da luz para ajustar a temperatura de forma automática.

Biomimética aplicada ao controlo térmico

Na natureza, o álamo (Populus alba) sobrevive a variações bruscas de temperatura recorrendo a duas estratégias principais. Durante períodos quentes e secos, a folha enrola-se e apresenta a face ventral, mais reflexiva, reduzindo a absorção de radiação solar. À noite ou em estações frias, a água condensada na superfície liberta calor latente, protegendo o tecido vegetal contra geadas. O grupo coreano replicou esse mecanismo ao combinar processos de resfriamento radiativo e de aquecimento latente num único compósito.

O material baseia-se num hidrogel de poliacrilamida enriquecido com íons de lítio (Li+) e hidroxipropilcelulose (HPC). Cada componente exerce uma função distinta: o Li+ capta e liberta humidade, regulando o calor latente, enquanto a HPC alterna entre estados transparente e opaco consoante a temperatura, modulando a passagem ou reflexão da luz solar.

Quatro modos de operação automática

Graças à conjugação desses elementos, o termostato biomimético alterna entre quatro estados sem qualquer intervenção externa:

  • Noite fria ou abaixo do ponto de orvalho: o hidrogel absorve humidade, condensa água e liberta calor, elevando a temperatura do material.
  • Dia frio com baixa radiação: a camada permanece transparente, deixando a luz solar atravessar e aquecer a superfície, ao mesmo tempo que a água capturada reforça o efeito estufa local.
  • Clima quente e seco: a humidade interna evapora, promovendo resfriamento evaporativo que reduz rapidamente a temperatura da superfície.
  • Alta temperatura e forte insolação: a HPC torna-se opaca, refletindo parte da radiação visível e infravermelha; simultaneamente, a evaporação continua, combinando reflexão e resfriamento evaporativo para maximizar a dissipação de calor.

A transição entre esses modos é governada por parâmetros ambientais, como temperatura, humidade relativa e intensidade luminosa, sem necessidade de sensores ou circuitos eletrónicos. O resultado é um sistema passivo que imita a resposta dinâmica das folhas reais.

Resultados experimentais e ganhos energéticos

Ensaios realizados ao ar livre demonstraram que o material conseguiu manter a superfície até 3,7 ºC mais fria do que revestimentos convencionais em dias de verão. No inverno, alcançou um aumento de temperatura de até 3,5 ºC face às mesmas referências, evidenciando a dupla função de aquecimento e resfriamento.

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Imagem: Tecnologia & Inovação

Para avaliar o impacto em larga escala, os investigadores recorreram a modelos de simulação cobrindo sete zonas climáticas definidas pela ASHRAE, que incluem condições que vão de climas quentes e húmidos a frios e secos. Os cálculos apontaram para uma poupança anual máxima de 153 MJ por metro quadrado em comparação com coberturas de telhado comerciais voltadas apenas ao resfriamento radiativo.

Perspetivas de aplicação

De acordo com o coordenador do projeto, professor Young Min Song, a tecnologia demonstra que conceitos biomiméticos podem oferecer soluções práticas para edifícios, veículos e outras estruturas que necessitem de regular temperatura sem onerar o consumo de energia. A flexibilidade do hidrogel permite a aplicação em superfícies curvas ou móveis, abrindo possibilidades em vestuário técnico, tendas e embalagens térmicas.

O desenvolvimento encontra-se ainda em fase laboratorial, mas os autores defendem que os materiais utilizados são comuns na indústria química, o que pode facilitar a transição para a produção em grande escala. Estudos futuros devem focar-se na durabilidade do compósito sob exposição prolongada aos raios ultravioleta, na resistência mecânica e na integração com sistemas construtivos atuais.

A investigação insere-se numa tendência global de explorar o resfriamento passivo como alternativa às soluções baseadas em ar-condicionado, que respondem por parcela significativa do consumo energético urbano. Ao incorporar também a função de aquecimento, o dispositivo coreano procura ampliar o leque de uso e tornar-se relevante em regiões de clima temperado, onde as necessidades térmicas variam ao longo do ano.

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