Mestre Negoativo celebra história negra mineira no encerramento do Sonora Brasil

O músico mineiro Mestre Negoativo subiu ao palco do Sesc Caborê, em Paraty (RJ), na noite de sexta-feira (28), e encerrou a 27ª edição do festival Sonora Brasil com um espetáculo dedicado à contribuição negra para a formação de Minas Gerais. O show lotou o espaço e reuniu público de várias idades para uma apresentação que reuniu música, memória e crítica social.

Espetáculo destaca ancestralidade e resistência

Durante pouco mais de uma hora, Negoativo utilizou vozes, percussões e o berimbau para percorrer o que chama de “caminho da Minas Gerais preta”. O repertório abordou temas como a violência histórica contra a população negra, o trabalho forçado no garimpo e a resistência cultural mantida em quilombos. Entre uma canção e outra, o artista explicou o conceito de sankofa — movimento africano de retorno às origens — que guia o seu trabalho.

O músico relatou que se prepara “há anos” para compartilhar a própria “afro-mineiridade”. Crescido em ambiente familiar com raízes quilombolas, afirmou entender o palco como extensão desse percurso: “É necessário que a gente se aproxime daquilo que nos pertence”, declarou ao público. Ele também citou influências de manifestações tradicionais do estado, como moçambique, candombe, vissungo, congo e catopês, além de nomes internacionais como James Brown e Bob Marley.

Instrumento central no espetáculo, o berimbau foi apresentado como “ponte ancestral” que o fez acessar referências africanas na infância. O som do arco musical conduziu momentos de celebração coletiva, nos quais a plateia respondeu a cantos e palmas sob orientação do artista.

Parceria com Douglas Din ficou incompleta

A apresentação de Paraty seria dividida com o rapper mineiro Douglas Din, parceiro de Negoativo no roteiro do Sonora Brasil. Din, porém, não pôde viajar por questões de saúde. Ao comentar a ausência, Negoativo definiu o encontro entre os dois como “diaspórico de gerações”: enquanto ele se apoia em tradições afro-mineiras, Din traz a influência do hip-hop. Juntos, percorreram várias cidades no decorrer do projeto, apresentando versões inéditas construídas a partir da mistura de estilos e instrumentos.

Sonora Brasil percorre o país desde 2024

Promovido pelo Serviço Social do Comércio (Sesc), o Sonora Brasil reúne formações musicais que representam a diversidade regional brasileira. No biênio 2024-2025, dez grupos selecionados por curadoria especializada realizaram mais de 300 shows em cerca de 70 municípios. Cada encontro reúne artistas de vertentes distintas, estimulando trocas criativas e novas leituras de repertórios tradicionais.

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Imagem: Últimas Notícias

O ciclo iniciado em 2024 chegou ao fim em Paraty, mas o público ainda tem dois concertos antes do encerramento oficial do fim de semana. Neste sábado (29), às 19h, sobem ao palco Geraldo Espíndola & Marcelo Loureiro, representantes dos ritmos do Mato Grosso do Sul. No domingo (30), será a vez de Manoel Cordeiro & Felipe Cordeiro apresentarem sonoridades paraenses, seguidos pela banda local Mundiá, que contará com participação de Manoel Cordeiro.

Memória coletiva em evidência

A proposta de Negoativo de “mostrar a Minas Gerais que não é vista” colocou foco em temas que, segundo ele, permanecem ausentes no debate público. Ao cantar sobre quilombos, o músico ressaltou o papel dessas comunidades na preservação de saberes tradicionais e na afirmação identitária de descendentes de africanos no país. O repertório incluiu letras sobre trabalho escravo, exploração mineral e continuidades de violência no presente.

Apesar do teor crítico, o tom geral foi de celebração. O público respondeu com coro e aplausos a passagens que exalavam orgulho pela herança africana. Ao final, Negoativo agradeceu a presença de jovens e de antigos frequentadores do festival, reforçando o convite para que “outras gerações assumam a afro-mineiridade” nos palcos e fora deles.

Com o encerramento em Paraty, o Sonora Brasil conclui mais uma etapa de circulação pelo território nacional, reforçando a intenção de divulgar expressões musicais que nem sempre têm espaço em grandes centros. O projeto prepara-se agora para planejar nova rota de apresentações ao longo de 2025, mantendo a premissa de valorizar a diversidade cultural brasileira.

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