Belém — O governo do Pará prorrogou para 31 de dezembro de 2030 o prazo para que todos os produtores rurais identifiquem eletronicamente o rebanho bovino e bubalino no estado. A decisão, formalizada pelo governador Helder Barbalho (MDB) em 2 de julho, altera o cronograma original que fixava a exigência até o fim de 2025.
O que muda com o novo decreto
A medida modifica o Sistema de Rastreabilidade Bovídea Individual do Pará, instituído em 2023, que previa a conclusão das etapas de implantação até dezembro de 2026. Com o decreto, as datas‐limite foram dilatadas em quatro anos, estendendo a obrigatoriedade para cria, recria, engorda, abate, leilões e exportação.
Durante a assinatura, realizada na 64ª edição do Encontro Ruralista, na sede da Federação da Agricultura e Pecuária do Pará, Barbalho afirmou que a ampliação “atende ao setor produtivo” e estimula mercados a “valorizar quem produz com regularidade ambiental”. Segundo o governador, o objetivo é conciliar produção pecuária e preservação florestal.
A identificação será feita por meio de brinco eletrônico aplicado a cada animal. O dispositivo armazenará dados como origem, movimentação e destino, permitindo rastrear a cadeia produtiva e detectar bovinos provenientes de áreas com desmatamento.
Contexto nacional e justificativas
O adiamento aproxima o calendário paraense do Plano Nacional de Identificação Individual de Bovinos e Búfalos, que projeta rastrear todo o rebanho brasileiro até 2032. Representantes do Executivo estadual sustentam que a nova data dá fôlego a pequenos e médios produtores, que alegam custos e dificuldades técnicas para cumprir a exigência no prazo anterior.
Nos bastidores, entidades do setor rural apontavam desafios como escassez de mão de obra qualificada para instalar os dispositivos, limitações de conectividade em áreas remotas e impacto financeiro na aquisição dos brincos eletrônicos.
Reação de organizações ambientais
A organização ambiental Mighty Earth considerou a postergação um retrocesso. Para Boris Patentreger, líder de Natureza da entidade, o estado “dá um golpe na luta contra a destruição da floresta amazônica”. Ele avalia que o atraso “arriska mais perda florestal e incêndios, empurrando a Amazônia para um ponto de inflexão irreversível”.
A Mighty Earth pediu que o Pará restabeleça “um cronograma ambicioso e aplicável”, dialogue com sociedade civil e comunidades indígenas e assegure que não ocorram novos desmatamentos para expansão pecuária.
O Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola (Imaflora) também manifestou preocupação. De acordo com Bruno Vello, coordenador de políticas públicas da ONG, a meta original era “ambiciosa”, mas necessária diante das mudanças climáticas. Ele reconhece pressões de produtores, mas defende políticas adicionais para compensar o adiamento e acelerar a transição sustentável da pecuária.
Imagem: Internet
Impacto econômico e ambiental
O Pará possui um dos maiores rebanhos bovinos do Brasil, com estimativa superior a 24 milhões de cabeças, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A pecuária representa parcela significativa do Produto Interno Bruto estadual e influencia diretamente a geração de emprego e renda no interior.
Ao mesmo tempo, estudos ambientais apontam a expansão agropecuária como principal vetor de desmatamento na Amazônia. Ferramentas de rastreabilidade são vistas como essenciais para coibir a compra de animais oriundos de áreas ilegais, permitindo ao estado atender exigências de mercados internacionais cada vez mais rigorosos quanto à procedência da carne.
Próximos passos
Com a nova regulamentação, a Secretaria de Estado de Desenvolvimento Agropecuário e da Pesca deverá publicar portarias complementares para detalhar etapas de adesão, responsabilidades de produtores e penalidades em caso de descumprimento.
Setores da indústria frigorífica acompanham o tema com atenção. Grandes compradores avaliam que a rastreabilidade é condição para acesso a nichos de exportação premium, sobretudo na União Europeia. Já associações de criadores afirmam que a flexibilidade de prazo garante adaptação econômica sem comprometer competitividade.
Enquanto isso, organizações ambientais prometem intensificar o monitoramento independente do desmatamento e pressionar por compromissos mais rígidos durante as discussões preparatórias para a Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, a COP30, sediada em Belém.
O debate deverá ganhar força nos próximos meses, envolvendo governo, setor produtivo, sociedade civil e investidores internacionais interessados na redução de emissões associadas à pecuária amazônica.






